Venda de casas novas supera construções em 100 mil fogos numa década
Falta de casas para comprar é um problema em Portugal. Apesar de estarem cada vez mais caros, os imóveis novos vendem-se rapidamente.
A crise na habitação em Portugal já dura há décadas e, para já, não tem fim à vista, apesar das iniciativas de vários governos para resolver a falta de oferta ajustada às necessidades das famílias. Um dos motivos que tem levado ao agudizar do problema está relacionado com a velocidade de licenciamento e construção de casas, que não tem respondido ao ritmo e volume da procura. Na última década, a venda de casas novas superou a construção de habitação em mais de 100 mil fogos (+69%). Isto apesar de as casas novas estarem cada vez mais caras, tendo superado pela primeira vez o patamar dos 300 mil euros no verão de 2024.
Há um claro desequilíbrio no mercado residencial português a nível do stock: a procura está alta e intensa, sobretudo, nos grandes centros urbanos, enquanto a oferta continua a chegar a conta gotas. E é precisamente na disponibilidade de mais casas para vender que reside boa parte da solução para esta crise de acesso à habitação em Portugal, coincidem políticos de vários quadrantes e especialistas do setor imobiliário e da construção. O caminho passa por conjugar construção nova, reabilitação, sem esquecer de apostar em alternativas como a conversão de lojas e escritórios em casas, a construção de habitação em solos rústicos, bem como na construção modular, pré-fabricada e em 3D.
O que é certo é que é preciso acelerar a colocação de mais casas no mercado por diferentes vias, porque a construção nova, por si só, não está a conseguir dar resposta às necessidades da procura. Esta realidade é bem visível nos dados mais recentes do Instituto Nacional de Estatística (INE): nos primeiros nove meses de 2024, foram concluídos 18.109 fogos (+2% face ao período homólogo), enquanto foram vendidas 22.762 casas novas (+6%). Isto quer dizer que a venda de casas novas está acelerada, tendo superado as construções em 4.653 fogos.
A questão ganha contornos ainda mais expressivos ao verificar que as transações de casas novas em Portugal já ultrapassam a conclusão de fogos há mais de uma década. Entre o verão de 2014 e o mesmo período de 2024, foram construídas cerca de 150 mil casas, enquanto foram vendidas mais de 253 mil habitações novas. Ou seja, a venda de casas novas está a ocorrer a um ritmo muito superior à construção habitacional, havendo mesmo uma diferença superior a 100 mil fogos na última década. Os dados do INE sugerem, assim, que as casas novas colocadas à venda são rapidamente vendidas e não chegam para cumprir as necessidades da procura.
A construção tradicional de casas leva, por si só, vários anos, um prazo que muitas vezes se alonga perante os atrasos nos licenciamentos urbanísticos. Ainda assim, tem-se verificado que há mais casas licenciadas do que concluídas desde o início de 2015 (no verão de 2024 houve quase mais 3 mil casas com licença em novas construções do que fogos construídos). E tem-se observado um aumento dos licenciamentos de casas novas em 2024, depois de o simplex ter entrado em vigor (apesar de ainda causar constrangimentos nas autarquias, que aguardam revisão do diploma pelo Governo de Montenegro).
Casas novas cada vez mais caras por altos custos de construção e carga fiscal
As casas novas em Portugal são rapidamente vendidas, apesar de estarem a ficar cada vez mais caras. No verão de 2024, o preço médio das habitações novas transacionadas alcançou mesmo os 300 mil euros, o maior valor desde que há registos contabilizados. E, segundo o INE, registou-se uma subida homóloga nos preços das casas novas de 8,1%, o maior aumento em dois anos.
Este aumento dos preços das casas novas no nosso país tem uma explicação simples. Os custos da construção não pararam de aumentar, depois de terem atingido máximos históricos em meados de 2022, perante a crise inflacionista que fez disparar os preços dos materiais de construção. O que se sente agora é que o preço de construir uma casa nova está a subir de forma relativamente estável entre os 3% e os 4% e que este aumento é explicado pelo elevado custo de mão de obra (que é escassa no país), uma vez que os materiais têm registado quedas homólogas nos preços nos últimos meses.
A estes custos de construção de casas há que somar ainda elevada carga fiscal, como o IVA a 23%, que se mantém, pelo menos, para já. Depois de a decida do IVA para 6% ter sido travada quer pelo Parlamento (que chumbou a autorização legislativa), quer pela transposição de uma diretiva europeia em matéria fiscal, o Governo anunciou recentemente que está a preparar uma nova proposta de lei para baixar o IVA aplicado à construção de habitação. Esta é uma medida há muito reclamada pelos profissionais do imobiliário e construção, que admitem mesmo que a redução do IVA para 6% poderá trazer mais casas e mais baratas para o mercado.
A par de tudo isto, os elevados preços das casas novas também espelham a lei da oferta e da procura: como há menos casas concluídas face à elevada procura, os preços tendem a subir. E esta falta de oferta de nova construção (e os seus elevados preços) explica também o facto da maioria das famílias optarem por comprar casas usadas.
Das 40.909 habitações vendidas entre julho e setembro de 2024, 79% dizem respeito a casas usadas (+21,3% face ao mesmo período do ano anterior), revelou o INE. Aqui há também um efeito contágio nos preços: as casas usadas ficaram 10,5% mais caras num ano, tendo o custo médio se fixado em 200 mil euros pela primeira vez em 15 anos.
“Para contrariar a evolução dos preços da habitação, é necessário reduzir a atual carga fiscal incidente sobre a construção e o imobiliário, garantir a celeridade dos processos de licenciamento e promover uma revisão da lei dos solos, além de promover melhores apoios à construção e à reabilitação de casas”, defendeu Manuel Reis Campos, presidente da Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas (AICCOPN) em entrevista ao idealista/news, admistindo que a construção industrializada também pode fazer parte da solução, “uma vez que reduz a dependência de mão de obra” e acelera os processos.
Publicado a: 29 de Janeiro de 2025
Por: Idealista